“Guerra de espermas” pode gerar novas espécies



A imagem acima mostra o esperma de duas espécies de moscas relacionadas dentro de um aparelho reprodutor. Os espermas estão “competindo” em uma luta evolutiva que, conforme os cientistas concluíram, muitas vezes leva à criação de espécies inteiramente novas.
A competição sexual no reino animal é forte, não importa se você é um mamífero, um pássaro ou um inseto. Boa parte desta competição vem antes do acasalamento, fenômeno que é chamado de seleção pré-copulatória. Os machos de muitas espécies brigam entre si para ganhar o privilégio de acasalamento. Outros evoluíram elaboradas demonstrações físicas, como o pavão, ou chamadas de acasalamento persuasivas, para alcançar seu objetivo.

Mas há um outro tipo de competição, a seleção pós-copulatória, que acontece depois do acasalamento. Quando uma fêmea tem múltiplos parceiros, seu trato reprodutivo torna-se um campo de batalha. Com o tempo, isso pode resultar em heteromorfismo de esperma – a produção simultânea de vários tipos de esperma por um único macho. Estes espermatozoides podem diferir na forma, tamanho e até mesmo complemento cromossômico. Alguns nem sequer são capazes de fertilização, e só existem para perturbar o esperma dos machos concorrentes.

Nesse tipo de competição, as fêmeas de algumas espécies participam praticando um fenômeno que os cientistas chamam de “escolha críptica do sexo feminino”. Algumas fêmeas podem armazenar o esperma de vários machos diferentes, manipulando a paternidade e escolhendo qual esperma irá fertilizar seus óvulos. Consequentemente, as fêmeas de algumas espécies, principalmente de insetos, aves, répteis, gastrópodes e aracnídeos, podem acasalar várias vezes e alocar esse esperma de acordo com gatilhos fisiológicos autônomos, como fenótipo paterno ou outras características. Basicamente, essa escolha aumenta as chances da mãe de reproduzir com o macho “mais apto”.

A seleção pós-copulatória e todas as suas estratégias reprodutivas podem levar a grandes mudanças evolutivas. De fato, é tão importante que pode dar origem a especiação – o ponto da evolução no qual um ramo de espécie se torna dois.

No entanto, até os biólogos não conseguiram observar com detalhes toda essa ação. “É difícil observar a competição entre ejaculação e discriminação feminina entre esperma, uma vez que isso ocorre dentro da fêmea e pode envolver interações bioquímicas, fisiológicas e morfológicas complexas”, explica Scott Pitnick.

Agora, Pitnick, junto com uma equipe de biólogos da Faculdade de Artes e Ciências da Universidade de Syracuse (EUA), descobriu uma maneira de assistir a seleção pós-copulatória: modificando geneticamente os espermatozoides de duas espécies de moscas relacionadas para que brilhem no escuro.

As duas espécies divergiram mais de 260.000 anos atrás (o que não é muito tempo em termos evolutivos), e essa divergência pode ter sido instigada por “guerras de esperma”.


Olhando a imagem acima, você pode ver dois espermatozoides diferentes. O esperma turquesa pertence a Drosophila simulans, e o vermelho-alaranjado pertence a Drosophila mauritiana.

Mesmo que a mosca fêmea tenha acasalado com esses dois machos diferentes, seu corpo invocará a escolha críptica do sexo feminino como uma forma de influenciar as probabilidades em favor de seu candidato reprodutivo ideal. Os pesquisadores poderão assistir, por exemplo, a fêmea se desfazendo de certo esperma de propósito, ejetando-o de seu aparelho reprodutor. Assim, eles poderão avaliar a previsibilidade dos resultados de acasalamento.

“Por enquanto, nosso estudo mostrou que a seleção sexual pós-copulatória pode rapidamente gerar incompatibilidades críticas entre ejaculações e tratos reprodutivos femininos que limitam o fluxo gênico entre populações isoladas ou espécies”, observou Pitnick. “Por que a promiscuidade feminina e, por extensão, a seleção sexual pós-copulatória são tão onipresentes, é provável que seja um motor generalizado de especiação”. 

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